segunda-feira, 2 de abril de 2012

SONHOS



A GESTAÇÃO DE UMA POSSIBILIDADE SÓ É PASSÍVEL DE ACONTECER NO VENTRE DE UM SONHADOR”


SONHOS


         Refeição que possui o gosto de nossos mais profundos desejos. Tem o poder de acalmar, preparar e treinar a alma para o exercício de um ideal que se busca. Todas as pessoas bem nutridas por este alimento jamais desistem. Associado a outros ingredientes tem o poder de auxiliar na realização de todos os objetivos de vida.



CUSTO


         O preço mais alto que se paga é o de ser chamado de maluco e ridicularizado pelas pessoas desiludidas que dizem ter os pés no chão.




TIRA-GOSTO


NOSTALGIA


CAVERNA ESCURA QUE ABRIGAVA UMA FLOR
FLOR QUE NÃO TINHA COR
FLOR QUE NÃO TINHA CHEIRO
FLOR QUE NÃO TINHA A FORMA DE FLOR
FLOR SEM ATRIBUTOS DE FLOR
AINDA SIM, SENTINDO-SE UMA VERDADEIRA FLOR



DIFÍCIL SENTIR-SE FLOR SEM SÊ-LA
IMERSA NA ESCURIDÃO
CEGA DE SÍ
SENTINDO-SE INCOMPLETA E SUFOCADA
APRISIONADA E ACUADA APENAS PELO DESEJO DE SER
CHORAVA O SONHO CONTIDO


IMERSA NA SUA FRIGIDEZ, SONHAVA COM O SOL
SEDENTA DE FRESCOR, SONHAVA COM A CHUVA
ASFIXIADA DE INSATISFAÇÃO, SONHAVA COM O AR
OFUSCADA DE SEU BRILHO, SONHAVA COM O ARCO-ÍRIS
SONHAVA VIVER E SER UM PEDACINHO DE CADA SONHO SEU
SONHAVA COM A  POSSÍVEL TRANSFORMAÇÃO DO IMPOSSÍVEL


FLOR FEITA DE SONHOS
SENTIA-SE SEM PODER SE AFIRMAR COMO TAL
SENTIMENTO CONCRETAMENTE VIVIDO
AFIRMAÇÃO TEORICAMENTE IMPOSSÍVEL
COMO DECLARAR SUA EXISTÊNCIA?
SÓ SE O SONHO DE SER UMA FLOR BROTASSE DE UM BELO JARDIM


BELO JARDIM NÃO EXISTIA
EXISTIA UM TRISTE E ÁRIDO JARDIM
JARDIM SOLITÁRIO SEM FLORES
SENTINDO-SE JARDIM CARENTE DE ATRIBUTOS PARA SÊ-LO
CHORAVA A AUSÊNCIA TRAZENDO CONSIGO 
SENTIMENTO DA PRESENÇA DAS FLORES
PRESENÇA QUE ALIMENTAVA O SONHO DE SER


COMO SER FLOR SEM JARDIM?
COMO SER JARDIM SEM FLOR?
CADA QUAL O COMPLEMENTO NECESSÁRIO
BASTANDO UM SONHO DE UNIÃO
BASTANDO A UNIÃO DE SONHOS
BASTANDO TÃO POUCO PARA O MUITO QUE SE SONHAVA


A FORÇA DO SONHO SE TRANSFORMA EM CHAMA
O SONHO CHAMA O SOL
O SONHO CHAMA A CHUVA
O SONHO CHAMA O AR
O SONHO CHAMA O ARCO-ÍRIS
O SONHO CHAMA A CHAMA DO SER


A CHAMA DO SONHO CRIA A ENERGIA DA TRANSFORMAÇÃO
A TRANSFORMAÇÃO FAZ PARIR O QUE ESTAVA CONTIDO
A SEMENTE FAZ PARIR UM BROTO
O BROTO FAZ PARIR A FLOR
 A FLOR FAZ PARIR O JARDIM
O JARDIM FAZ PARIR A NOSTALGIA


A NOSTALGIA TRAZ A LEMBRANÇA DA SEMENTE
SEMENTE QUE HABITA A CAVERNA DE NOSSA ALMA
SEMENTE QUE AGUARDA TRANSMUTAÇÃO DO SER QUE A HABITA
SEMENTE QUE ANSEIA A EXPLOSÃO DO QUE ESTÁ CONTIDO
SEMENTE CIENTE DE QUE É O QUE NÃO É AINDA
À ESPERA DO QUE VIRÁ A SER



INGREDIENTES



Todos os seus desejos
Uma imaginação bem grande
Muita fé
Bastante determinação


PREPARO


         Junte ao seu desejo uma boa porção de imaginação. Prepare uma massa bem consistente e deixe descansar por algum tempo. Neste intervalo, prepare um delicioso recheio feito à base de muita fé. Com a massa no ponto, modele vários bolinhos de sonho recheando-os com este poderoso recheio. Coloque tudo no tabuleiro da vida untando-o com bastante determinação para evitar que os sonhos possam agarrar no fundo do mesmo e serem torrificados após serem levados ao forno do aqui/agora. Feito tudo isto, ascenda o fogo e deixe que cada bolinho de sonho seja aquecido ao seu calor. Se o forno não estiver bem aquecido os sonhos não crescem e não coram o suficiente para serem saboreados. Se o sonho não crescer, corre o risco de minguar.
Vigie para não passar do ponto e assista a maravilhosa transformação de seus sonhos.  Uma simples massa se tornará uma realidade saborosa que poderá ser degustada por você e caso deseje, oferecida a todos aqueles que com os ditos pés no chão não puseram a mão na massa.




SOBREMESA



O SONHO DA SEMENTINHA


         Lá estava ela, dentro de um túnel escuro, sem saber ao certo quem era. Carregava consigo o dom de ser uma flor, mas não conseguia se afirmar como tal. Contida em um sonho que jamais se desabrochava pôs-se a chorar sendo repreendida por dona minhoca que passando por ali a censurou com aspereza:
— Que coisa incômoda é esta a tirar a tranqüilidade do nosso lar?
                                     A doce e suposta flor querendo se desculpar e desabafar sua dor sussurrou baixinho no ouvido de dona minhoca:
— Desculpe-me, eu não queria tirar-lhe o sossego. Sou apenas uma linda flor que se sente acuada e presa.
             Dona minhoca deu uma estridente gargalhada e pontuou com ironia:
— Vê se te enxerga! Será que além de incômoda és cega também? Você não passa de uma coisa qualquer. Flores não vivem aqui, vivem em jardins. Você não tem a forma, o aroma e a beleza de uma flor.
              A sementinha indignada com a descortesia da minhoca perguntou:
— Como posso me enxergar neste mundo tão escuro e apertado? Não há espelhos por aqui.
— Eu posso ser o seu espelho, basta que você acredite naquilo que eu lhe disser. Neste mundo tão escuro é difícil a gente se perceber. Precisamos do outro para nos dizer quem somos.
— Mas, você me disse que sou uma coisa qualquer e eu não me sinto assim. Sei que sou uma flor ou carrego no mínimo o dom de sê-la.
— Se você quer acreditar na sua fantasia vai acabar maluca um dia. Repreendeu a minhoca abanando a cabeça em sinal de reprovação saindo logo em seguida sem dar muita atenção àquela coisinha que se julgava uma flor.
                 A sementinha confusa permaneceu ali, quietinha, se questionando:
— Será que sou maluca? Será que não é flor o que vejo e sinto dentro de mim?
                 Perdida em seus pensamentos foi desperta por uma formiga que começou a tocá-la de uma forma diferente. Sem saber das intenções da mesma, protestou em voz alta:
— Hei, o que você está fazendo comigo? Para onde está me levando? Largue-me! A formiga incomodada com tal protesto ordenou com firmeza e sem educação:
— Cale a boca! De hoje em diante você será o meu alimento. Espero que preste pelo menos para isto.
— Mas eu não sou alimento de ninguém. Eu sou uma flor! Solte-me, por favor!
                 A formiga não deu a mínima e continuou sua caminhada carregando-a nas costas. Apertada e presa como sempre, só que desta vez sob as garras da formiga, foi tomada de um medo intenso fechando os olhos, tentando negar esta nova condição de aprisionamento que a formiga lhe impusera. E assim foi levada durante muito tempo a algum lugar que nem mesmo sabia onde. Repentinamente, sem saber como, sentiu um certo alívio. Resolveu abrir os olhos e se deparou com uma grande surpresa. Um mundo inédito e luminoso se descortinou à sua frente. Mesmo querendo manter seus olhos abertos, a claridade lhe incomodava e involuntariamente os fechavam. Numa tentativa de se adaptar à nova situação, vivendo o incômodo e o fascínio em concomitância, perguntou, ansiosamente, à formiga:
— Que lugar é este?
                Sem querer perder seu tempo com explicações, a formiga continuou a sua caminhada sem dar nenhuma resposta à sementinha. No entanto, foi vencida pela insistência daquela florzinha contida numa semente que lhe perguntava repetidamente:
— Por favor, me diga que lugar é este?
— Você precisa me deixar trabalhar sossegada! Repreendeu a formiga.
— E você precisa me responder que lugar é este! Insistiu a sementinha.
— Isto é um jardim deserto e abandonado. Respondeu, finalmente, a formiga impacientemente.
— Talvez aqui seja o meu lugar. Sou uma flor e preciso de um jardim. Pode me deixar aqui, por favor?
— Você quer ficar num lugar que nem mesmo existe? Ironizou a formiga.
— Como assim? Como pode existir um lugar que não existe? Se ele está aqui é porque existe. Ponderou a sementinha.
— Jardim deserto e abandonado é simplesmente um lugar que não existe para ninguém. Completou a formiga.
               Neste momento, a sementinha foi tomada de grande angústia. Aquelas palavras tocaram no seu mais íntimo ser. Identificou-se com aquele jardim, pois era também uma flor que não existia para ninguém. Precisava tanto de um jardim e ele estava ali, deserto. Talvez aquele jardim também precisasse de uma flor para viver o seu mais nobre sonho, e ela, florzinha ainda contida, estava bem ali, assim como ele, abandonada e deserta. Era necessário que um começasse a existir para o outro fazendo desabrochar o sonho contido. Desesperada suplicou à formiga:
— Me deixe aqui para que eu possa me exercer neste jardim!
               A formiga não dava a mínima e continuava seu trabalho de carregar o seu precioso alimento. Este era um dos trabalhos mais importantes na comunidade das formigas. Quanto mais a sementinha se debatia em súplicas, mas apertada ia ficando nas garras daquela formiga ensurdecida para suas lamentações. Repleta de inquietação começou a repetir incessantemente a mesma frase numa tentativa de vencer a formiga pelo cansaço:
— Você nunca pára para me ouvir. Para que tanta pressa?
               Vencida pela insistência, a formiga respondeu irritada:
— Como você é chata! Não vê que não posso parar. A minha vida é trabalhar e nada mais. Não tenho tempo para bate papos.
— Poxa, viver só de trabalho deve ser muito ruim. Eu sonho com uma vida melhor que não se limite apenas a uma coisa só.
— Pois saiba que o meu trabalho é a minha vida e é ele que transformará você no meu alimento. Sendo assim, você não terá tempo para viver os seus sonhos. Se aquiete e não perca tempo com eles.
— Sonhar não é perda de tempo. Sonhar é o tempo e o espaço que abriga uma vida ainda melhor. Ressaltou a sementinha com sabedoria.
               A formiga foi ficando curiosa com aquele jeito esquisito da semente  de pensar sobre a vida. Sem perceber, foi estendendo o assunto numa tentativa de desvendar a curiosidade acerca de um mundo totalmente desconhecido vivenciado por outro ser.
— Só o trabalho tem o poder de melhorar a nossa vida. Afirmou a formiga.
— Mas, sem o sonho o trabalho perde o sentido. O trabalho existe para ajudar a realizar os nossos sonhos. Completou a sementinha.
— Nunca sonhei. Não tenho tempo para isto. O meu lema é: “Trabalhar para sobreviver!”.
— Acho que somos muito diferentes. Enquanto você pensa em sobreviver, eu penso em viver plenamente.
— O que é viver plenamente? Perguntou a formiga cheia de curiosidade.
                Aproveitando a curiosidade da formiga e querendo tirar proveito da situação, a sementinha falou com sabedoria:
— Eu não posso dizer-lhe o que vem a ser viver plenamente. Eu posso apenas mostrar-lhe. Para isto você terá que me largar neste jardim que você julga não existir para que o sonho de ser uma flor possa, finalmente, desabrochar inaugurando uma vida plena.
                A formiga querendo se manter no controle e poder expressou, finalmente, o seu autoritarismo:
— Você depende de mim! Se eu leva-la, mato uma flor e um sonho.
— E eu não poderei matar a sua curiosidade. Você passaria o resto da sua vida pensando no que vem a ser uma vida plena. Instigou a sementinha.
— Ah! Eu pensando? Nunca me imaginei assim. Não tenho tempo para pensar. Como já lhe disse, a minha vida é só trabalhar. Daqui a pouco nem me lembro mais que você existe.
— Mas, isto é muito sério! O trabalho roubou suas lembranças? Perguntou a sementinha.
— Para que servem as lembranças?
— Para viver o prazer de recordar um sonho que pôde ser vivido. Assim, aumentamos a nossa fé passando a acreditar ainda mais na possibilidade de viver todos os sonhos que carregamos dentro do nosso ser.
— Pois eu não carrego sonho algum, carrego apenas você nas minhas garras. Vamos parar com esta conversa, pois você está ficando pesada e eu cada vez mais cansada.
— Se você soubesse sonhar se cansaria menos e se cansando menos tudo ao seu redor ficaria mais leve. Falou com ternura a sementinha acuada numa tentativa de estimular na formiga outra forma de ser.
— Como é que o sonho pode descansar alguém?
— Na verdade, não somos apenas nós que carregamos um sonho, o sonho também nos carrega. No colo do sonho a gente relaxa e acredita que tudo vai dar certo. Acreditando que tudo vai dar certo, a gente se sente mais segura e forte. Munida de força, tudo fica leve, fácil de levar.
              Sentindo inveja da sabedoria da flor, a formiga tentou desmanchar toda a esperança que brilhava em seu semblante dizendo:
— Eu não deixarei você viver o seu sonho e acabarei de uma vez com esta filosofia barata.
— Eu acredito que posso ser uma flor. A sua amargura jamais apagará a minha esperança. O meu sonho vai arrancar-me de suas garras e carregar-me em seu colo acolhedor.
— Você é muito ingênua. Como isto poderia acontecer? Você está bem presa ao meu desejo  e decidi não libertar você. Falou com escárnio a formiga autoritária.
— Não sei ainda como poderei me libertar de sua prepotência e autoritarismo, pois existem infinitas formas. Sei apenas que será escolhida aquela que melhor se adequar ao meu desenvolvimento.
              O cansaço foi tomando conta da formiga. Exausta tentou impor limites àquele diálogo que parecia fragiliza-la:
— Cale a boca agora mesmo! Cada vez que você intensifica seus sonhos, você fica mais pesada. Tenho muito que caminhar e está ficando cada vez mais difícil carrega-la.
— Eu não vou me calar e você não irá conseguir me carregar, pois meus sonhos são leves para mim, no entanto, pesados demais para quem não consegue construir os seus.
— O meu trabalho é a minha única construção. Falou a formiga com moralismo.
— O trabalho dignifica o ser, mas, cuidado com ele, pois além de libertar tem também o poder de aprisionar e matar.
— Pare com esta sua tagarelice! Você já está me matando de cansaço com este seu discurso tolo.
— Não sou eu que estou lhe matando de cansaço, mas esta sua forma mecânica de trabalhar. Por que você não pára e descansa um pouco?
               Neste instante, a formiga olhou para o céu e percebeu que algumas nuvens negras anunciavam o presságio de uma tempestade. Tentou apressar ainda mais o passo e foi novamente interrompida pela sementinha:
— Você não vai agüentar. Relaxe!
— Não posso perder tempo. Tenho muito que fazer.
— Você não estará perdendo tempo, pelo contrário, estará ganhando tempo de relaxamento e descanso. Relaxar é um trabalho de renovação.
— Este tipo de trabalho não me interessa. Desprezou a formiga, os conselhos da flor.
               Imersa em sua teimosia e rigidez, a formiga continuou caminhando e apressando cada vez mais o seu passo. À medida que andava foi, gradativamente, se tornando impossível carregar uma semente que parecia inicialmente tão leve. Sem entender o que estava acontecendo, repentinamente foi obrigada a parar, pois o seu corpo foi perdendo os movimentos e mal podia respirar. Desabou-se sobre o chão, mas continuou apegada à semente mantendo-a agarrada às suas garras.
— Você não irá me vencer! Eu não te solto por nada neste mundo. Mesmo que eu morra, continuará atrelada a mim. Finalizou a formiga irrompendo-se num sono profundo semelhante à morte.
        Vencida pelo sono, sem a consciência de estar viva ou morta, a formiga sonhou pela primeira vez. Sonhou com a chuva caindo e penetrando pelos poros de uma terra seca e sedenta de água. Viu o sorriso da terra em cada gole de água que a chuva fartamente lhe oferecia matando a sua sede e deixando-a macia e fofinha. Fertilizada pela umidade, viu aquela terra abraçando cada semente presente em seu seio. Assistiu a maravilhosa transformação das sementes. Presenciou o nascimento de um belo jardim. Emocionou-se pela primeira vez! Nunca vira espetáculo mais belo e emocionante. Conquistou a benção de enxergar e sentir plenamente. No entanto, o júbilo da transformação só não acontecia para uma semente presa nas garras de um ser horrível que inerte a sufocava em suas garras. Aquele ser transformou o seu sonho num pesadelo. Queria liquidá-lo, mas não sabia como. Incomodada, não se satisfazia em ser apenas uma espectadora de seu sonho, precisava entrar dentro dele e salvar a semente. Mas não tinha como entrar no sonho. Naquele momento fora lhe concedido apenas o direito de assisti-lo. Sem poder viver ativamente aquele sonho, sentiu-se impotente e tristonha. Impotente para agir, identificou-se com a semente aprisionada. Identificando-se foi desenvolvendo uma empatia muito grande dentro de si.
        De repente surgiu uma esperança.  Viu uma formiga trafegando cabisbaixa pelo cenário onírico carregando algo com um apego desenfreado. Pensou que talvez ela pudesse salvar aquela semente. Tentou influencia-la de todas as formas, mas ela parecia não ter ouvidos e nem mesmo olhos, pois não percebia nada ao seu redor estando totalmente presa em si mesma. Teve raiva e pena dela, mas nada podia fazer. Podia apenas assistir a tragédia da mesma por não perceber as coisas belas. A impotência fazia um desejo ardente de mudança ir crescendo dentro de si. Foi então que começou a perceber que o seu desejo semeava a semente de um sonho. Passou assim a ter muitos sonhos. Viveu por um bom tempo o prazer de sonhar, precisava agora acordar para realizar tudo que havia construído em sonho. Quem haveria de acordá-la?
         Acordou. Acordou como todos nós acordamos depois de uma noite bem dormida.  Acordou relaxada e descansada. Sem saber quanto tempo dormira, foi despertada por uma voz suave que lhe ordenou com doçura:
— Levante, acho que já dormiu o suficiente.
— Quem é você? Perguntou a formiga.
— Eu sou a transformação de um sonho. Respondeu uma bela flor que acolhia a formiga sobre suas pétalas protegendo-a.
— Você quer me dizer com isto que és uma realidade?
— Isto mesmo, sou a flor que realizou o sonho de uma sementinha.
— Você é uma bela flor! Afirmou a formiga admirando-a.
— Fico feliz de vê-la conseguindo me enxergar assim.
— Mas, por que? Perguntou a formiga confusa.
— Por causa de uma longa história. Respondeu a flor olhando no fundo dos olhos da formiga.
— Que história?
— Você quer mesmo saber?
— Se você quiser me contar...
— É uma longa história. Você teria tempo para ouvi-la? Perguntou a flor querendo checar a disponibilidade da formiga.
— Não sei como, mas aprendi de alguma forma que o tempo é a gente que faz. Sendo assim, agora sou toda ouvidos.
              A bela flor deu um sorriso exalando um perfume relaxante e tranquilizador. Com muita ternura contou para a formiga uma história mais ou menos assim:
— Era uma vez uma sementinha que pensava ser uma formiga maldosa. Com medo de desabrochar, ela não se permitia sonhar, pois sabia que os sonhos fazem desabrochar o nosso mais íntimo ser. Para se proteger dos sonhos criou uma armadura que a deixava dura muito dura, difícil de rachar. O sentimento mais forte que carregava dentro de si era a inveja, pois o que mais temia era assistir a realização dos sonhos de qualquer ser que encontrasse em seu caminho. Sendo assim, tentava destruir todas as sementes que carregavam um sonho aprisionando-as em suas garras. Fazia disto o seu trabalho e alimentava-se da tristeza do outro. Não percebia que quanto mais se alimentava de tristezas, mais triste e amarga ficava. Um dia, entretanto, encontrou e tentou aprisionar uma semente que acreditava ser uma flor. Ela acreditava tanto, que ninguém conseguia abalar a sua fé. Ao contrário da formiga maldosa, ela se alimentava apenas de esperança, otimismo e amor. Sabia que nenhuma garra malvada seria capaz de carregar por muito tempo estes sentimentos. E foi o que aconteceu. A formiga sucumbiu-se. No entanto, mesmo vencida não largava a semente. Quando tudo parecia estar perdido, a benção divina caiu sobre a semente boa e sobre a semente má em forma de chuva. A água abençoada limpou os maus e fertilizou os bons sentimentos. À medida que este milagre acontecia, as garras da semente que se julgava uma formiga má foram relaxando e um lindo broto nasceu da boa semente que nunca duvidou ser uma flor. Este broto foi crescendo lentamente e se transformando numa linda flor que alimentava com seu néctar e ninava todos os dias uma sementinha que em forma de formiga precisava sonhar um sonho bom e, finalmente, acordar do pesadelo de não conseguir sonhar ser ela mesma.



                                                                                 

                                                          







                                       












































































Nenhum comentário:

Postar um comentário